terça-feira, 21 de julho de 2009

No meu tempo é que era bom!

Quantas vezes você já escutou isso??

O mais interessante é que você escuta isso de gente dos 20 (às vezes mais novos) aos 120 anos.

Então, peráiumpouquinho. Alguém deve estar errado nessa história, já que o tempo de cada um está bastante deslocado.

Ou não.

Vai ver estão todos certos.

Nostalgia, saudades dos bons tempos, ou qualquer que seja o nome que damos pode ser bastante saudável, quando na dosagem correta.

O problema começa quando a pessoa tem uma dificuldade insuperável em separar sentimentos das boas qualidades intrínsecas a determinado objeto de interesse.

O nostálgico saudável olha com carinho para as coisas que lembram bons tempos da sua vida sabendo, porém, que às vezes a maior qualidade daquilo é somente transportá-lo para outro tempo. Um tempo reconfortante que poderia incluir, por exemplo, chegar do colégio e ficar a tarde toda de bobeira e sem maiores preocupações. Tocar guitarra, escutar música, ir tomar um Milk-shake de ovomaltine com os amigos ou, mesmo, deitar no sofá para assistir à Sessão da Tarde.

Mas, ao mesmo tempo, este personagem reconhece que a qualidade que ele via naquele filme, desenho, música, livro, etc., pode não ser assim uma Brastemp. Ou até, indo no popular, era uma merda mesmo.

Mas traz boas lembranças, e isso é o que importa.

A pessoa que sofre de nostalgia “maligna” perde-se em algum ponto deste passado onírico e, colocando um biombo diante dos olhos, tem uma dificuldade fisiológica em enxergar qualidade em qualquer manifestação que não seja associada àquela época. Vamos resumir: para ele, tudo que é feito hoje é um lixo.

Ao mesmo tempo, nosso “nostálgico maligno” parece sofrer de uma patologia que o leva a achar que tudo que é relacionado àquele seu “tempo melhor”, normalmente sua infância e adolescência, traz consigo uma qualidade indiscutível. Não importa o quão ridículos sejam seus argumentos para defender sua posição.

O processo que ele usa em sua argumentação, via de regra, é citar somente as coisas boas da infância, varrendo para baixo do tapete todo o lixo da época, fazendo o oposto com as coisas atuais.

E não se enganem. Existem muitos destes por aí. Talvez até você seja um deles...

Vocês podem identificá-los por seu chavão característico: "no meu tempo que era bom!" (e sua variação “ah! Meus tempos!). Normalmente repetido incansavelmente e sem direito a réplica.

Eu prefiro me considerar um nostálgico benigno.

Continuo gostando de diversos filmes, desenhos e músicas do "meu tempo", mesmo que hoje não os considere tecnicamente bons.

Dia desses da vida comprei uma pilha de DVDs da minha altura com filmes da década de 80. Analisando friamente, metade deles são uns filminhos cheios de clichês que não valem muita coisa. Mas o que me interessa são as boas sensações que eles me trazem.

Um ponto relevante a se observar nessa discussão é que o ser humano tende a se comprazer em passar a imagem de que tem mais bagagem do que o próximo, mesmo que a diferença de idade seja mínima.

Sempre pensam que as crianças de hoje não sabem o que é diversão (já escutei um camarada de 17 anos com esse discurso). Mas se refletirem por um minuto, vão observar que seus pais pensam a mesma coisa deles e que seus avós pensam a mesma coisa em relação a seus pais.

E voltamos à questão inicial: estariam todos errados (ou todos certos)?

Vamos analisar um exemplo e, recomendo, que se você reconhece em si tendências de nostalgia maligna, pare de ler por aqui (sob pena de começar a espumar de raiva).

Analisemos os desenhos animados. Por mais que eu ainda me divirta assistindo a Pica-pau, Turma do Pernalonga, e similares, é muito claro para mim que os desenhos animados de hoje, na média, são extremamente superiores aos que assistia quando criança (para registro, nasci em 1972).

Antes que o choro e ranger de dentes comecem, e seja lançada uma fatwa contra mim, vamos continuar.

Os nostálgicos de plantão vociferam sobre a violência e falta de valores positivos dos desenhos atuais, em relação aos antigos. Existe uma dificuldade de entender que em todas as épocas existem desenhos (música/livros/filmes) ótimos e outros péssimos. Hoje a situação é a mesma, com alguns desenhos horrorosos e violentos, mas alguns tão bons que não encontram similar entre os das décadas passadas.

Continuemos com o exemplo do Pica-pau. Aquele camaradinha de cabeça vermelha e muito gosto por sacanear o próximo. Embora eu me divirta até hoje com isso, o fato é que 100% dos seus desenhos se resumem ao mesmo argumento e, com pouquíssimas variações, até ao mesmo roteiro. Vamos lá: alguém corre atrás do Pica-pau e ele passa até o final fugindo e dando uma sacaneada no perseguidor. E só.

Divertido, sem dúvida. Mas não há como negar que a história é só isso.

Agora peguemos um desenho que eu considero um dos melhores de todos os tempos: Bob Esponja. A originalidade do argumento já é inegável e os roteiros são variados e sensacionais. Quem tem filhos vai reconhecer outros, como Os Padrinhos Mágicos.

Para falar a verdade se pusermos em análise somente Bob Esponja e os Padrinhos, acho que podem juntar no outro lado da balança todos os desenhos da minha infância que não há competição.

Isso sem falar naqueles desenhos ou filmes dos quais você guarda boas lembranças, mas se for assistir hoje, vai sair completamente decepcionado. Às vezes as lembranças são muito melhores do que a realidade.

As pessoas que agem, impensadamente, desta forma correm o risco de passar por situações absolutamente ridículas. Uma vez eu escutei a seguinte pérola:

- Esses seriados japoneses de hoje são horríveis! Bom era o National Kid!

Para tudo! Para tudo!! Para tudo!!!

Alguém aí já viu National Kid? Ou Ultraseven? Ou Ultraman? Ou Spectreman? Se há uma coisa que sempre se manteve no mesmo nível (ruim de doer, diga-se) são esses seriados japoneses. Então o que leva uma pessoa aparentemente razoável e de bom nível intelectual a dizer uma bobagem dessas?

É o melhor! É o melhor! ...

A resposta é: paixão.

E nada contra nos apegarmos a coisas que nos trazem boas lembranças e nos fazem sentir bem. Desde que reconheçamos os motivos que regem esta paixão e que os tratemos como eles merecem: uma questão sentimentos e, não necessariamente de qualidade técnica.

Enfim, olhar com carinho para o passado não tem nada demais, e é até saudável, porém se você quer colocar uma venda nos olhos para impedi-lo de enxergar um monte de coisas legais que estão por aí, tudo bem também.

Mas o prejuízo é todo seu.

6 comentários:

Climão Tahiti disse...

Ah... Nos meus tempos... Ih, esqueci. Fiquei velho ou bebi demais e esqueci. =p

Brincadeiras a parte,

O que define se algo é bom ou ruim são muitas vezes mais fatores técnicos do que necessariamente o roteiro apenas.

Quando eu era pirralho tinha uma tal de "A turminha" ou "Ursinhos Carinhosos" que não ficam devendo em nada a Turmas de hoje em dia.

Mas existia sempre uma questão no fundo, em todo desenho animado, que de certa forma morreu nos desenhos como Bob Esponja, onde o objetivo maior é ser o mais idiota, fazer rir do ridículo, um tipo de humor que criança não deveria acompanhar porque criança tende a copiar o que assiste e não quero um filho meu falando com voz de retardado que usa uma calça quadrada.

Nesse aspecto Padrinhos Mágicos ao menos tem algum valor: é um moleque que pode ter tudo que quer e sempre arca com as consequências de suas vontades, perfeitamente aplicável em moleques mimados que tem tudo na mão.

É diferente também os heróis japoneses, como os que você cita, que em geral cultuam o bem e tem alguma mensagem, claro me referindo apenas aos que citou.

Muito boa análise, diga-se de passagem.

Tyler Bazz disse...

No meu tempo é que os blogs eram bons. A gente chegava, falava o nada que fez o dia todo, colocava lá a música que a gente tava ouvindo na hora e pedia feito louco pros amigos comentarem.

Não tinha essa história de ficar escrevendo uma crônicas boas pra cacete assim, não!

Varotto disse...

Quando eu falei que considero os desenhos de hoje melhores do que os da minha época de criança fiz questão de frisar o "na média" porque é óbvio que tinha muita coisa legal também.

O próprio pica-pau, que usei como exemplo, me divirto até hoje com ele e, dia desses, gravei da TV um clássico: aquele em que ele tenta descer as cataratas em um barril. Mas é claro para mim que, em termos de criatividade, ele fica léguas atrás dos exemplos que dei.

Em relação ao próprio Bob Esponja, não concordo que o objetivo principal dele seja fazer rir do ridículo. Vejo o camarada quadradinho mais como uma Polyanna subaquática, que vê a vida em cor-de-rosa, de uma forma surreal (carái, véééii!).

E com relação aos bons exemplos, é claro que até determinada idade as crianças não tem senso crítico para diferenciar mau comportamento de uma crítica mais profunda. É por isso evito que meu filho veja desenhos como "As Terríveis Aventuras De Billy E Mandy". Acho engraçadíssimo, mas esse desenho peca exatamente pela falta do contraponto com o que é certo. (só tem a parte "ruim").

No caso do Bob Esponja nem acho isso t'ao relevante, pois n'ao enxergo nenhum comportamento negativo sendo reforçado.

Nesse ponto, guardando as devidas proporções, até South Park é melhor. Porque embora mostre barbaridades "imostráveis", no final sempre fica claro o que é certo e o que é errado. Mostra-se preconceitos mil às pencas, mas sempre como uma forma de criticar os próprios. Mas é claro que, mesmo se excluirmos as imagens e linguagens inapropriadas, uma criança acaba não tendo alcance crítico para enxergar isso.

E acaba que o South Park, debaixo daquele monte de podridão, adota a mesma cartilha do Disney, por exemplo: Você mostra o que é errado (o vilão e suas vilanias, da Disney) para, no final, mostrar o que é certo (a derrota do vilão, o mocinho casando com a mocinha, etc.).

Valeu gente!

Barbarella disse...

Nossa, pensei que só iria ler uns "rabiscos" mas você me pegou de surpresa, gostei muito das suas colocações, e para ser sincera nunca tinha pensado dessa forma.

Tenho uma nostalgia benigna, tenho saudades de algumas coisas, cotinuo escutando algumas músicas do meu tempo, mas sei apreciar também as novidades.

É varotto, teríamos muita coisa para conversar se eu começar a falar o que era bom na minha época, ~mas não irei começar a falar aqui pq pelo risco de não saber a hora de parar...

**

Anônimo disse...

Quando você tocou em Pica-Pau eu pensei: "mas pô, Pica-Pau é uma obra-prima, um dos melhores desenhos de todos os tempos, não fale mau de Pica-Pau"
Mas aí, quando falou de Bob Esponja, você me pegou, realmente é muito melhor do que Pica-Pau.
Eu não tenho nenhum tipo de nostalgia, pra mim não existem "velhos tempos", e sim o tempo atual é que se tornará os "velhos tempos" pra mim, no futuro.

Anônimo disse...

ler todo o blog, muito bom